quarta-feira, 9 de outubro de 2013

PSICOSE! De onde veio Norman Bates?


“Psicose veio todo do livro de Robert Bloch”(Alfred Hitchcock)
O mais notório, impactante e, talvez, melhor filme do mestre do suspense Alfred Hitchcock foi, sem dúvidas, Psicose.
A música, o suspense, o terror psicológico, e uma cena que assustou o mundo, ninguém nunca antes havia visto um filme como aquele: macabro, perturbador e, acima de tudo, brilhante. Os filmes de suspense/terror nunca mais seriam os mesmos após a obra-prima de Hitchcock.


Mas o que muitos não sabem, é que Psicose é uma adaptação de um livro, lançado em 1959 pelo escritor Robert Bloch. Como escreveu Dougas E. Winter em seu livro “Faces of Fear” (Faces do Medo):
“Dois mestres do horror imortalizados pelo filme Psicose… um, é claro, seu diretor, Alfred Hitchcock, o outro é o homem que escreveu o romance. E ninguém nunca disse melhor que o próprio Hitchcock: ‘Psicose veio todo do livro de Robert Bloch’”.
É bem verdade que o endeusado na história sempre foi Hitchcock. Para muitos, Psicose veio todo de sua mente. Mas como confessaria mais tarde, Hitchcock apenas adaptou o livro de Bloch para as telas. Claro, uma adaptação magistral do gênio do suspense. Em suas mãos, o livro de Bloch tornou-se objeto de culto, e seu filho mais famoso, o filme, transformou radicalmente o cinema em Hollywood.
Mas hoje não estou aqui para falar de Hitchcock ou de seu filme, estou aqui para falar do cara desconhecido, um desconhecido que “só” escreveu Psicose: Robert Bloch.
Antes de sua morte em 1994, aos 77 anos, Bloch muitas vezes brincava dizendo que seu obituário começaria com “Psicose”, um livro que representava apenas uma pequena porcentagem de todo seu trabalho, mas a totalidade de sua fama. Psicose, tanto o livro quanto o filme, teve um efeito retumbante no horror, tanto literário quanto cinematográfico.
Citando novamente Douglas Winter:
“Desde o auge da depressão dos Contos Bizarros e das evocativas adaptações cinematográficas de Frankenstein e Drácula, da Universal, o conto de terror sofreu até meados dos anos de 1950, como se os verdadeiros horrores da Segunda Guerra Mundial tivessem extinguido a necessidade humana de confrontar ficcionalmente a morte. Os monstros vigorosos ressurgiram na era Eisenhower: primeiro com o inócuo contexto da ficção-científica, depois com os exuberantes filmes internacionais americanos como ‘I Was a Teenage Werewolf’ (1957), e finalmente, no contexto sério de filmes e livros como Psicose”.
Psicose, entretanto, não foi a primeira ou a última exploração psicopatológica ou o único livro de Bloch que influenciou a ficção moderna de horror.
Sua primeira história foi publicada em 1935, quando ele tinha apenas 17 anos, um adolescente recém-saído do ensino médio. E desde a primeira obra de Bloch vemos que ele baseava o horror de seus personagens principais em suas incrompreensíveis naturezas humanas. Ao contrário de outros escritores da época, os personagens de Bloch não dependiam de ações ou fenômenos sobrenaturais para impulsionar as histórias. Os monstros de Bloch não eram lobisomens, vampiros ou alienígenas, seus monstros eram nós, os próprios humanos. Era a semente sendo plantada e que décadas depois floresceria num belo pinheiro, um pinheiro chamado O Silêncio dos Inocentes.
É claro que, no início, Bloch era um completo desconhecido. Suas histórias eram publicadas vez ou outra em revistas de horror como a “Weird Tales”, que não tinham vida útil de 30 dias. Poucas pessoas as liam. E foi assim durante os anos 30 e 40, com suas histórias explorando a psicopatologia humana, muitas vezes fundindo o sobrenatural com o psicológico e reviravoltas espetaculares no final
.Título: Enoch
Autor: Robert Bloch
Data de publicação: Setembro de 1946
Revista: Weird Tales (páginas 28 a 35)
Sinopse: Ele quer que eu mate pessoas para ele. Enoch. A única coisa que vive no topo da minha cabeça. Eu não posso vê-lo. Eu não posso pegá-lo. Eu só posso sentí-lo, ouví-lo, e obedecê-lo. E ele sussurra… Mate!
Enoch é um pequeno conto sobre um simples homem e um diabólico demônio envolvidos em uma relação simbiótica assassina. O homem mantém seu amigo abastecido de corpos frescos e nutritivos cérebros e, em troca, recebe fabulosos sonhos que encantam sua mente (esquizofrênico nem um pouco).

Outra de suas histórias foi sobre o mais famoso dos serial killers, Jack, O Estripador. Em “Yours Truly, Jack the Ripper” (1943), Bloch escreve sobre um psicopata serial killer cujas vítimas são sacrificadas para satisfazer deuses do além. Adaptada para o rádio, a história virou uma série com 39 episódios que foi ao ar em 1944 e 1945.
“Eu percebi, com a Segunda Guerra mundial e lendo obras de psicologia, que o horror real não estava nas sombras, mas nesse mundinho torcido dentro dos nossos próprios crânios”, disse Bloch em uma entrevista para Dougas E. Winter.
Após a publicação de dezenas de contos, Bloch resolveu almejar ares maiores, e em 1947 lançou seu primeiro romance: “The Scarf”. The Scarf girava em torno de um jovem serial killer estrangulador cujos assassinatos resultavam de traumas na infância. Sete anos depois, um trio de romances publicados em 1954, “The Kidnapper”, “The Will to Kill” e “The Spiderweb”, já eram todos baseados na psicopatologia humana.
Três anos depois, algo aconteceu. Algo que mudou a vida não só de Bloch, mas, sem exageros, do mundo.
Em 1957, Bloch morava em Weyauwega, estado americano do Wisconsin. No inverno daquele ano, a polícia descobriu na zona rural de Plainfield, cidade distante a cerca de 40 minutos de Weyauwega, os terríveis assassinatos em série de Edward Theodore Gein.
Homem pacato, trabalhador braçal, e conhecido por ser meio retardadado, Gein escondia um demente psicopata sexual por baixo de sua máscara de homem simples. Ao adentrarem sua casa, a polícia descobriria o corpo de sua última vítima dependurado de cabeça para baixo, sem a cabeça, rasgado como um animal de caça. O coração estava numa panela em cima do fogão e havia cabeças enfeitando sua sala. Os horrores descobertos na casa de Gein eram tão medonhos que quase tudo era inpublicável para os jornais da época.
Embora notícias dos assassinatos e da prática de canibalismo terem sido mencionadas, outros comportamentos de Gein foram censurados, como o roubo de cadáveres de um cemitério local, travestimento e outros comportamentos monstruosos.
Dois anos depois, em 1959, Bloch publicaria o romance “Psicose” baseado no caso Gein. O livro não é baseado no serial killer em si, mas como disse Bloch:
“… a noção de que o homem ao lado pode ser um monstro insuspeito mesmo em um microcosmo fofoqueiro cheio de vida de uma pequena cidade”.
Embora o gênero de ficção fosse geralmente ignorado pelos críticos literários, Psicose recebeu críticas positivas, incluindo menções nos jornais The New York Times e Times Herald.
Pouco tempo depois, o agente de Bloch, Harry Altshuler, recebeu uma oferta de sete mil e quinhentos dólares. Alguém, cujo nome não deveria ser mencionado, queria comprar os direitos da obra para adaptá-la ao cinema. O lance subiu para nove mil e quinhentos dólares. Bloch aceitou. Ele nunca havia vendido um livro antes para Hollywood. Vocês já devem saber quem era o homem querendo os direitos do livro.
Hitchcock fez de Psicose um filme de mesmo nome. Não mudou nada. O resto já é história.
Apesar dos enormes lucros gerados pelo filme, Robert Bloch nunca recebeu nenhuma compensação direta.
“O que Bloch tinha a dizer em Psicose influenciou toda a arte do horror. Tanto escrita como cinematográfica. Foi um salto assustador, uma sondagem das assustadoras mentes de homens que se encontram à espreita… Ele elevou os cabelos dos leitores enquanto eles viravam a página, e mostrou a escritores como lidar com um novo tipo de história de terror”, disse Hugh B. Cave, autor de Os 100 Melhores Livros de Horror.
No Brasil, Psicose, de Robert Bloch, teve dois lançamentos, em 1959 e 1964. Desde então, nunca mais foi lançado. Mas eis que, em julho de 2013, a DarkSide Books, editora brasileira especializada em horror e fantasia, “desenterrou” essa que é uma das principais obras literárias de horror do século 20, lançando-a em versões brochura (classic edition) e capa dura (limited edition). Após 49 anos, as novas gerações têm a oportunidade de ler a obra original do livro que foi um divisor de águas do horror moderno.
Como explica uma reportagem da Folha de São Paulo, adquirir os direitos para publicação no Brasil não foi nada fácil.
“Procuramos os agentes americanos que nos indicaram, mas eles não detinham mais os direitos da obra. Então, ao longo de um ano, chegamos aos advogados espanhóis que cuidam dos direitos da família do Robert Bloch. Eles pediram para conhecer a editora e mandamos exemplares para eles”, dizem na reportagem, Chico de Assis e Cristiano Menezes, os sócios da DarkSide.
O resultado não poderia ter sido melhor: as duas edições lançadas pela editora carioca possuem um caprichado trabalho gráfico, com a edição de capa dura trazendo páginas extras, com imagens clássicas do filme.

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